Escreve, Leitor – Vassourinhas Solitárias

Por José Ivan de Lima

O carro de som parou na esquina da Praça Pai Tão. Era manhã de sábado de Zé Pereira. Ele tocava para foliões de um bloco carnavalesco, cujo roteiro terminava nesta praça. Com o recolhimento deles, ninguém ficou na pista, digo calçamento. A passarela estava vazia sob um sol causticante, quando estourou o frevo vassourinhas. Escutei o que sempre gostei de escutar, procurando companhia para a emoção contagiante daquele frevo. Foi aí que mergulhei nas cinzas do velho América ali pertinho. Digo cinzas mesmo que o prédio ainda esteja de pé, numa imagem combalida do presente.

Misturaram-se emoção com saudade, e, como num passe de mágica revi cenas externas do seu passado, onde Marcelo Lafayette sempre cheio de vida, puxava um coro: ”Rivaldo é chato, Rivaldo é chato “. O Rivaldo em questão era o queridíssimo Rivaldo Galindo, censurado pelo grupo, por passar apressado para não ser molhado. Diplomaticamente, ele voltou e entregou-se à brincadeira, submetendo-se a um banho com água fria. Estava restabelecida a paz carnavalesca, nas calçadas do velho América. Lembrei-me também de Jáder de Veríssimo, solando vassourinhas no seu sax. Jáder era soberbo e um show à parte. Sabendo da admiração que criava, ficava olhando para os lados disfarçando a timidez do artista.

Vassourinhas no ar. Solidão de pés para frevá-lo. Sem passistas, sem o América, sem Marcelo, Rivaldo e Jáder, todos “in memorem” e tantos outros sobrava um vácuo insuportável. Um vassourinhas solitário, não de sol e melodia, mas de calor humano. A consolação vem com a certeza que em outros locais essa solidão não existirá, e ele, como o segundo hino de Pernambuco, eletrizará foliões de todos os matizes, e entre eles espíritos alegres de grandes foliões de Sertânia. Com o fim do vassourinhas solitário, vejo de memória sair pela porta do América o espírito alegre de Luiz Pintor, com seu cavaquinho e uma toalha pendurada no pescoço, na pressa ele cruza com Zé das Neves, ocupado em ensopar um lenço com lança perfume da marca rodouro. Foi o clímax do devaneio meu… Salve seu Luiz! Leve um abraço para aqueles que não estão mais por aqui. Diga prá eles, que pelo menos, estão livres de ouvir as obras musicais para amestrar macacos, como disse um baiano, feitas nos carnavais da Bahia nos últimos anos. E também, que tem gente por aqui precisando, para melhor avaliar nosso carnaval, de ouvir atentamente Cazuza , quando ele canta “ Exagerado, deitado aos teus pés, eu sou mesmo exagerado…”

* Prof. Ivan de Lima é vereador. Já ocupou os cargos de prefeito, vice-prefeiro, presidente da Câmara de Vereadores e diretor da Escola Olavo Bilac.

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